Novo
medicamento para evitar a transmissão do vírus da Aids é adotado e avaliado no
Brasil
A Profilaxia Pré-Exposição Sexual
(PrEP), a mais recente estratégia de prevenção da transmissão do HIV, avança no
Brasil. Trata-se de uma pílula de uso diário que evita a contaminação pelo
vírus da Aids na quase totalidade dos casos. Aprovada em 2017 para uso no país
e distribuída desde o início deste ano no sistema público de saúde, a medicação
tem atraído pessoas com risco de se infectarem pelo vírus causador da Aids, de
acordo com estudos recentes. Apesar dos avanços, ainda há incertezas sobre o
risco de a PrEP promover o abandono de outras formas de prevenção, como o uso
de preservativos, o que aumenta o risco de transmissão de HIV, gonorreia,
sífilis, clamídia e outras doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). De acordo
com o Ministério da Saúde (MS), 8% das trabalhadoras do sexo têm sífilis e a
maioria não usa camisinha em relações sexuais com clientes constantes,
namorados ou maridos.
“A efetividade da PrEP no Brasil
depende da ampliação do acesso a esse medicamento e do atendimento adequado aos
usuários”, afirma a médica epidemiologista Maria Amélia Veras, professora da
Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Efetividade é o
desempenho de um medicamento em reais condições de uso por um número elevado de
usuários. “Para funcionar de modo satisfatório, essa ou qualquer outra
estratégia de prevenção contra o HIV pressupõe que as necessidades dos usuários
sejam levadas em consideração e que os profissionais da saúde possam estar
disponíveis para conversar com eles. Para que isso ocorra, precisamos que o SUS
seja fortalecido com mais recursos e pessoal.”
A PrEP consiste no consumo de um
comprimido com dois medicamentos antivirais – tenofovir e emtricitabina – e é
indicada para quem não se infectou com o vírus e tem relações sexuais de risco,
com pessoas contaminadas pelo HIV. Produzidos pela empresa farmacêutica
norte-americana Gilead, os comprimidos são importados e, além do sistema
público de saúde, podem ser comprados em farmácias ou por internet a um custo
médio mensal de R$ 300. Há uma perspectiva de produção nacional: o Instituto de
Tecnologia em Fármacos da Fundação Oswaldo Cruz (Farmanguinhos/Fiocruz), do Rio
de Janeiro, anunciou em março um acordo com uma empresa farmacêutica nacional para
produzir o tenofovir e a emtricitabina. O Instituto Nacional de Propriedade
Industrial (INPI) recusou o pedido de patentes das duas formulações no Brasil,
o que facilita sua produção no país, mas o plano de fabricar os fármacos a
preços menores ainda depende da aprovação do registro na Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa).
Aprovada nos Estados Unidos em
2012, com poucos efeitos colaterais (entre os quais enjoo e flatulência), a
PrEP tem uma eficácia superior a 90%. Um estudo de pesquisadores da Fiocruz
publicado na Lancet HIV em março deste ano indicou uma alta taxa de
adesão a essa abordagem preventiva no Brasil: 83% dos 450 participantes
chegaram até o final das 48 semanas propostas de tratamento, fornecido pelas
instituições de pesquisa que colaboraram com o estudo. Os participantes eram
homens que fazem sexo com homens e mulheres transexuais – que se identificam
como sendo do sexo feminino, embora ao nascer tenham sido registradas como do
sexo masculino – não infectados por HIV. Todos mantiveram os hábitos sexuais e
tomavam PrEP regularmente: a proporção de pessoas que relataram ter feito sexo
anal sem preservativo com pelo menos três parceiros não se alterou de modo
significativo do início ao fim do período em que tomaram os antivirais.
“O abandono do uso do
preservativo aumenta o risco de transmissão de HIV, sífilis, gonorreia,
clamídia e outras doenças”
O problema é que, mesmo que o
medicamento tenha alta eficácia contra o HIV, o abandono do uso de preservativo
aumenta o risco de transmissão de outras DSTs. Na Espanha e no Canadá, por
exemplo, altas taxas de DSTs têm sido relatadas entre usuários de PrEP que
fazem sexo sem preservativo, observa o médico virologista Pablo Barreiro, do
Hospital Universitário Carlos III, de Madri, em artigo na revista Aids
Reviews de março deste ano.
Os mais vulneráveis
O MS estima que 866.092 pessoas vivam com HIV, das quais 84% foram diagnosticadas e 63% recebem tratamento. A taxa de detecção de Aids apresentou uma pequena redução – de 19,5 casos por 100 mil habitantes em 2015 para 18,5 para cada 100 mil em 2016 –, mas está aumentando principalmente entre homens de 15 a 29 anos. Dois grupos são os mais vulneráveis à infecção e apresentam as menores taxas de adesão aos tratamentos. O primeiro é o das mulheres transexuais, com uma taxa de infecção que varia entre 17% e 64%, segundo estudos preliminares do MS. O segundo é o de gays e outros homens que fazem sexo com homens, dos quais 18% já se infectaram com o vírus causador da Aids, de acordo com o MS. Entre as mulheres, as taxas de detecção do HIV crescem na faixa entre 15 e 19 anos (de 3,6 casos por 100 mil mulheres em 2006 para 4,1 por 100 mil em 2016) e na faixa de 60 anos ou mais (de 5,6 em 2006 para 6,4 em 2016). Nas outras faixas de idade, a tendência é de queda nos últimos 10 anos, principalmente entre as mulheres de 25 a 29 anos (de 30,5 por 100 mil em 2006 para 15 por 100 mil em 2016).
O MS estima que 866.092 pessoas vivam com HIV, das quais 84% foram diagnosticadas e 63% recebem tratamento. A taxa de detecção de Aids apresentou uma pequena redução – de 19,5 casos por 100 mil habitantes em 2015 para 18,5 para cada 100 mil em 2016 –, mas está aumentando principalmente entre homens de 15 a 29 anos. Dois grupos são os mais vulneráveis à infecção e apresentam as menores taxas de adesão aos tratamentos. O primeiro é o das mulheres transexuais, com uma taxa de infecção que varia entre 17% e 64%, segundo estudos preliminares do MS. O segundo é o de gays e outros homens que fazem sexo com homens, dos quais 18% já se infectaram com o vírus causador da Aids, de acordo com o MS. Entre as mulheres, as taxas de detecção do HIV crescem na faixa entre 15 e 19 anos (de 3,6 casos por 100 mil mulheres em 2006 para 4,1 por 100 mil em 2016) e na faixa de 60 anos ou mais (de 5,6 em 2006 para 6,4 em 2016). Nas outras faixas de idade, a tendência é de queda nos últimos 10 anos, principalmente entre as mulheres de 25 a 29 anos (de 30,5 por 100 mil em 2006 para 15 por 100 mil em 2016).
Do início de janeiro até o final
de março deste ano, 36 centros de saúde pública de 11 estados atenderam 1.401
pessoas interessadas em PrEP. No dia 5 de abril, na palestra de abertura de um
curso sobre Aids na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(FM-USP), a médica Adele Schwartz Benzaken, diretora do Departamento de
Vigilância, Prevenção e Controle de Infecções Sexualmente Transmissíveis,
HIV/Aids e Hepatites Virais do MS, anunciou os planos de aumentar o número de
pessoas atendidas e de centros de atendimento.
O primeiro grupo de usuários da
PrEP na rede pública de saúde foi principalmente de homens gays e outros homens
que fazem sexo com homens (84,5%) e brancos ou amarelos (61,3%) de alta
escolaridade, com baixa participação de mulheres transexuais e travestis
(1,2%). “Temos de nos esforçar para chegar às populações mais vulneráveis ao
HIV, como gays de baixa escolaridade, pessoas trans e trabalhadoras do sexo,
que são as que mais precisam da PrEP”, disse Adele. Como estratégia para deter
a transmissão do vírus, o sistema público de saúde já oferece a Profilaxia
pós-Exposição Sexual (PEP), que consiste no uso de outros antivirais em até 72
horas após exposições de alto risco para o HIV, com alta eficácia, como a PrEP.
O número de vezes em que a PEP foi adotada passou de 15.414 em 2009 para 87.414
em 2017, já que uma pessoa pode tomar mais de uma vez.
http://revistapesquisa.fapesp.br/2018/05/23/barreira-anti-hiv/
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